Dezesseis

Eu me lembro como se fosse ontem. De sair correndo do trabalho para saber se o resultado deu positivo. Do pixel pulsando no monitor. A barriga crescendo. De fazer força para levantar da cama do parto só para ver aquele narizinho por fração de segundos. De quando ele veio pra mim chupando a boca e me olhou com os olhos de jaboticaba mais lindos do universo. E de como todas as dúvidas que eu tinha a respeito do que fazer dissolveram no momento em que ele chegou nos meus braços.

Eu me lembro dos primeiros sorrisos e dos primeiros sustos. Da gargalhada, da cantoria e das artes. De achar graça e ficar com um misto de pena e raiva do pé grande desde a barriga, que destruiu sapatos na velocidade da luz até alcançar os atuais 46 e contando. Das paredes riscadas, lapiseiras destruídas, brinquedos quebrados. Do abraço delícia, do carinho absurdo, da cumplicidade.

Eu errei como só uma mãe sabe errar tentando acertar. Dei amor até você aprender a abusar, dei tapa até você aprender a desafiar, dei conversa até você aprender folgadamente que sempre pode me perguntar. Trabalhei tanto pra te sustentar e te criar sozinha, que acabei te deixando um pouco sozinho demais. Mas sempre fui uma mãe meio gato: gostava de sair para dar as minhas voltas, mas sempre que chegava da rua ia direto para o seu quarto fazer um carinho na tua cabeça e muitas vezes dormir sentindo aquele cheirinho que só os filhos têm.

E eu me lembro perfeitamente bem que nunca imaginei que finalmente chegaria o dia onde eu teria um filho rapaz. Tá, você já é rapaz tem algum tempo. Me deixa. E eu me lembro como se fosse ontem exatamente como eu me sentia quando eu tinha a sua idade.

Outro dia você me perguntou porque eu tenho orgulho de você. O que você faz ou é de tão fantástico assim. Sendo sincera como só uma mãe sagitariana pode ser: o mundo não vai te ver com os mesmos olhos que eu e isso é bom. Porque o que eu enxergo em você e o que eu acredito que você seja capaz, você vai ter que mostrar pras outras pessoas. Em compensação, cada pessoa que passar na sua vida vai te enxergar de um jeito diferente e se você prestar atenção, pode aprender um bocado sobre si mesmo.

Você se menospreza, mas eu enxergo suas qualidades, coisas que você pode desenvolver e levar para a sua vida adulta para construí-la do jeito que quiser. Você tem iniciativa e capacidade de liderança. Quando realmente quer, repete a mesma coisa até descobrir como dominá-la com perfeição. Embora seja disperso, tem uma memória visual excelente (o Rafa uma vez contou que quando você era pequeno “gravou” a página de um livro na cabeça e estava lendo dela ao invés de decorar a matéria da prova).

Não conheço muitas pessoas que em menos de 6 meses se tornam vice-campeões mundiais de um esporte que nunca haviam praticado antes. E embora você colecione medalhas de natação, jiu-jitsu e outros esportes que você vive alternando irrequieto, ainda reclama por não estar sempre em primeiro lugar. Primeiro lugar é legal, mas eu sempre achei engraçado você nunca ter percebido que as medalhas de prata e de bronze também colocam você no pódio.

E eu acho o máximo que você consiga tocar qualquer instrumento de ouvido, embora tenha vontade de gritar com você que você deveria ter aproveitado as aulas porque ser autodidata só te leva até um ponto.

Você sempre soube o que ia ser quando crescesse e agora não sabe mais e eu não ligo. É normal a adolescência ser esse furacão de descobertas. Querer ser cientista-químico-gênio-do-mal, piloto de caça, programador de jogos meio hacker, escritor de quilos e quilos de cadernos cheios de histórias nunca terminadas, poemas soltos e raps de improviso. O futuro, filho, é um lugar onde as coisas acontecem muito rápido e as pessoas acumulam habilidades, trabalhos e profissões. Você sempre pode começar de novo. De preferência, sem cometer os erros que eu cometi 😉

“Eu te amo, filho” eu sempre faço questão de dizer, a ponto dele ficar de saco cheio.
E ele responde sempre com a sua melhor imitação de Han Solo tupiniquim: “Eu sei”.

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